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O “RESTO” É CONVERSA FIADA

neylopesO escritor, compositor, intérprete e palestrante Nei Lopes, nos diz no seu Blog – Meu Lote, o seguinte, a respeito do lançamento da biografia do grande Wilson das Neves:
Já nas bocas a esperada biografia do Wilson das Neves – “Ô, Sorte! Memórias de um Imperador, organizado por Guilherme Almeida para a Editora Multifoco, Rio, RJ.   
O prefácio é de nossa lavra, como o seguinte:
O “Resto” é Conversa Fiada.
A visão simplista, reducionista e estreita que a sociedade de consumo criou sobre o samba costuma reduzi-lo ao universo carnavalesco das escolas. O samba, entretanto – e aqui parafraseamos Hermínio Bello e Paulinho da Viola – “não é só isso que se vê”: é muito (e não um pouco) mais.
Esse plus se traduz numa amplitude muito grande de enfoques, abordagens, definições e questões que suscita, as quais fazem com que reconheçamos no samba um fenômeno cultural de largo espectro, como o jazz, seu “primo” americano. E, mesmo enquanto arte musical pura e simples, a variedade de estilos de composição e interpretação do samba o revela como algo muito mais complexo que uma simples diversão carnavalesca, ou de fim de semana.
Das origens, o samba guarda estreita ligação com a religiosidade de base africana que subsiste no Brasil desde os tempos coloniais. Da mesma forma, sua trajetória histórica de resistência à opressão de fundo racista, o mantém indissoluvelmente ligado à experiência existencial do povo afrodescendente.
Por outro lado, sua inserção gradual em terrenos e ambientes antes vedados, como o do palco dos teatros, da transmissão radiofônica, do cinema, da televisão e, hoje, da internet, repete metaforicamente a caminhada, árdua, mas persistente, do povo afro-brasileiro no caminho da inclusão.
Essa caminhada é contada por episódios exemplares. Como foi a prática, décadas atrás, do concurso para outorga, no ambiente das agremiações, da láurea máxima de “Cidadão Samba”, título concedido àquele que, por seus talentos e habilidades como músico, compositor, dançarino, orador e “personalidade”, melhor representasse o que se esperava de uma “personalidade” do Mundo do Samba. Como é o inigualável homem “Das Neves” de que trata este livro. Que, além de tudo, faz parte, por tradição familiar, da seleta comunidade dos “olorixás” – os iniciados nos segredos do culto às divindades jeje-iorubanas.
Músico, percussionista, compositor, cantor, ator, e naturalmente dançarino, Wilson das Neves é dono de uma história pessoal e profissional única, como certamente comprovam as páginas escritas por seu cuidadoso biógrafo Guilherme Vasconcelos. E aí, finalizando esta breve apresentação, retomamos outra visão estreita, tacanha, que é aquela que, com intenção derrogatória ou por mero desconhecimento, costuma classificar como “sambista” qualquer um que cante um “sambinha” ou “bata” um pandeiro.
Sambista, com S maiúsculo, caros leitores e leitoras, é Wilson das Neves!
O “resto” (e aqui cabe muita gente) – é conversa fiada! (NL)


2 Comments Add Yours ↓

  1. Renê Ruas #
    1

    Mais uma vez Nei Lopes acerta na mosca. Com relação ao tal “Cidadão Samba”, infelizmente cá na terrinha o que determina os “títulos” de “sambistas” é o compadrio, a troca de favores, interesses pessoais e a vaidade. Como diz o Nei Lopes:
    “Costuma classificar como “sambista” qualquer um que cante um “sambinha” ou “bata” um pandeiro.
    Na mosca.

  2. Marcello Laranja #
    2

    O mestre Nei Lopes sempre acerta na mosca. Pincei a frase no seu texto e botei entre aspas por ser absolutamente verdadeira: “E, mesmo enquanto arte musical pura e simples, a variedade de estilos de composição e interpretação do samba o revela como algo muito mais complexo que uma simples diversão carnavalesca, ou de fim de semana”. Perfeito, definitivo. Salve os magníficos Nei Lopes, Wilson das Neves e todos os grandes sambistas com “S’ maiúsculo, pois o resto, sem dúvida nenhuma, é conversa fiada.



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