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ENTREVISTA COM O COMANDANTE HIDENORI SAKAO

“NAVEGADOR NAS ONDAS DO CHORO…”
Tivemos o privilégio de entrevistar o comandante Hidenori Sakao. Dentre muitas curiosidades ele nos contou que Luizinho 7 cordas e Evandro do bandolim lançaram a semente do Choro no Japão… Os chorões cariocas começaram intercâmbio depois; além de destacar os chorões brasileiros, é torcedor da Seleção Brasileira de futebol e se declara fã de Cauby Peixoto, Miltinho, Fabiana Cozza e Edith Veiga, dentre outros grandes artistas brasileiros. Mas, a inesquecível recordação foi quando viajou com Elizeth Cardoso em 1977 e 78…  O impacto da apresentação dela foi tanto que os japoneses abriram os olhos para música brasileira…
Confiram a entrevista na íntegra.                    

MARCELLO: Olá comandante, prazer muito grande para nós podermos entrevistá-lo. Seja muito bem-vindo ao blog do Clube do Choro de Santos.
COMDTE. SAKAO: O prazer é meu.  É uma grande honra para mim poder comunicar com o pessoal do Choro de baixada Santista, pois sou forasteiro.
MARCELLO: Como sempre fazemos, primeiro um “bate-bola” de apresentação. Então vamos lá!
Nome completo: Hidenori Sakao
Data e local de nascimento: 1931 em Yokohama, maior porto do Japão. Eu cresci ouvindo apito de navio como canção de ninar e meu despertador era o som de rebitagem da doca.
Time do coração: Torço no verde-amarelo em jogos internacionais.
Grupo de Choro preferido: Muito difícil citar a preferência. Brasil tem tantos chorões geniais.
Escola de Samba: Eu não tenho condição de julgar as escolas.
Cantor: intérprete – Caubi Peixoto, seresteiro – Carlos josé, sambista – Osvaldinho da Cuica, geral – Miltinho.
Cantora: intérprete – Claudya,  sambista paulista – dona Inah e Fabiana Cozza, dor de Cotovelo – Edith Veiga e Patricia Palma (Liuba).
MARCELLO: Comandante, há quantos anos o senhor vive no Brasil e por que escolheu São Paulo para viver.
COMDTE. SAKAO: Desembarquei no porto de Santos, armazém nº 14, antes da Bossa Nova. Depois me estabeleci em São Paulo por razão de maior concentração de comunidade japonesa fora do Japão.
MARCELLO: O senhor é um homem do mar, ex-comandante da Marinha de Guerra. O que o levou para a música, e, principalmente para a Música Popular Brasileira.
COMDTE. SAKAO: Primeiro contato com música Brasileira foi através do programa Música America Latina da Radio WVTR em Tokyo. Esta radio transmitia para o pessoal militar de ocupação após o final da segunda guerra mundial. Eu adorei o som exótico de samba e marcha.
MARCELLO: E de onde surgiu essa predileção pelo Choro. Até onde sei o senhor é um apaixonado por esse estilo musical brasileiro.
COMDTE. SAKAO: Logo após minha chegada aqui em São Paulo eu tive uma oportunidade de conhecer uma roda de choro. Desde então este ambiente musical me encantou.
MARCELLO: Na sua ótica, como estão os movimentos de Choro no Japão, o estilo vem se desenvolvendo bem por lá?
COMDTE. SAKAO: Atualmente Japão é segundo país do choro. Creio que quase todas as grandes cidades se ouve o som de pinho.
MARCELLO: O senhor achou importante a semente plantada pelos pioneiros a desenvolver o Choro no Japão, Luizinho 7 cordas, Evandro do bandolim e depois Aleh Ferreira?
COMDTE. SAKAO: Quem plantou a semente do choro no Japão foi Luizinho 7 cordas e Evandro do bandolim, sem dúvida. Baixaria de Luizinho causou grande admiração dos violonistas. Os chorões cariocas começaram intercâmbio bem depois.
MARCELLO: O senhor tornou-se empresário do meio musical, certo? Conte-nos como foi sua vivência e a experiência adquirida com os artistas. É, de fato, compensador?
COMDTE. SAKAO: Eu não virei empresário. Como eu fui funcionário do setor cultural do Consulado Geral do Japão durante 25 anos, todas as atividades dedicadas a música brasileira que eu fiz nesta época foi pura paixão. Imagine, minha obrigação era divulgar cultura japonesa para brasileiros. 
LUIZ PIRES: O sr. esteve no Japão por quantas vezes acompanhando músicos brasileiros? Quais as recordações mais marcantes?
COMDTE. SAKAO: Eu servi de intermediário para inúmeras atividades culturais entre Brasil e Japão. Mas, a inesquecível recordação é quando viajei com Elizeth Cardoso em 1977 e 78. Impacto de apresentação dela foi tanto que os japoneses abriram os olhos para música brasileira.
MARCELLO: Comparando com outras épocas bem mais férteis, como o senhor vê atualmente a Música Popular Brasileira no meio desses apelos midiáticos e manifestações pura e altamente comerciais que acabam maculando a boa imagem da nossa música.
COMDTE. SAKAO: Talvez com avanço de tecnologia eletrônica, aos jovens de hoje falta inspiração emocional. Mas, esta influência não só no Brasil, no mundo inteiro.
As vezes marketing na mídia deturpa a arte em nome do divertimento.
MARCELLO: O senhor também é adepto daquela máxima de que existem dois tipos de música, a boa e a ruim?
COMDTE. SAKAO: Eu não faço diferença por gênero. Eu acho que na música a estética é fundamental. Lembrei a famosa palavra de nosso poetinha Vinicius de Moraes [As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental] Puxa! Ele poderia ter dito Receita de Música em vez de Receita de Mulher.
LUIZ PIRES: Gostaríamos de perguntar ao sr. sobre a imigração japonesa no Brasil, e, especificamente no Estado de São Paulo…falando em herança cultural familiar, o que ficou dos primórdios da imigração para as gerações de hoje? Conseguiu-se manter a identidade da cultura tradicional mesmo com a realidade brasileira? O Sr. acha que essa identidade será preservada ou tende a se “abrasileirar” com o tempo?
COMDTE. SAKAO: Comunidade japonesa no Brasil está se integrando ao Brasil rapidamente. Mas, isso é curso natural da historia num país formado por diversos imigrantes. Apesar de miscigenação, descendência japonesa ainda preserva seu apelido GARANTIDO carinhosamente.
LUIZ PIRES: Em sua opinião, a que se deve o crescente interesse de brasileiros sem nenhuma ascendência oriental pela cultura japonesa? Imagino que hoje em dia seja comum encontrar muitos “gaijins” em eventos voltados para a colônia, não?
COMDTE. SAKAO: É a tendência mundial. Globalização é fruto da era de comunicação e processo inevitável de modernização.
LUIZ PIRES: Para o Sr. quais foram as maiores contribuições culturais dos japoneses? Hoje em dia, sair para comer sushi, por exemplo, é um hábito comum de muitas pessoas.
COMDTE. SAKAO: Maior mérito de imigração japonesa é, todo mundo sabe, contribuição na agricultura. Depois arte marcial e culinária.
LUIZ PIRES: Em sua opinião, em mais de cem anos de imigração no Brasil, quais foram os principais triunfos no relacionamento Brasil-Japão? E os fracassos?
COMDTE. SAKAO: Triunfo e fracassos?  Uma única resposta para os dois.  Apesar de um século de imigração, os japoneses no Brasil não tem bilionário nem extremamente pobre. Característica de japonês é tipicamente classe média. Trabalhar muito e educar filhos.
LUIZ PIRES: Agora conte-nos como foi seu encontro com Tom Jobim.
COMDTE. SAKAO: Conheci Tom Jobim na década de 50 em um bar de Copacabana, cujo nome não me lembro. Esse primeiro encontro foi só troca de cumprimentos. Nossa amizade se fortaleceu quando escrevi uma poesia sobre preocupação em relação à natureza do Rio de Janeiro num cartão de Natal que enviei na década de 70. Foi quando ele começou a me chamar de “Meu irmão”. Fiquei “muy-amigo” de birita, naturalmente.
MARCELLO: O senhor fez recentemente uma declaração fantástica dizendo que “Luizinho 7 cordas deveria ser considerado Patrimônio Público”, é isso mesmo?
COMDTE. SAKAO: Luizinho é grande poeta nas cordas e inspiração dele sai do seu coração naturalmente. Ele é a vernaculidade do Brasil em pessoa que não existe noutro país.
MARCELLO: O que achou da nossa recente participação no Festival Gastronômico “Sabores de São Paulo” no Parque da Água Branca, que o senhor muito gentilmente prestigiou. E aí, valeu? Fomos aprovados?
COMDTE. SAKAO: Eu sou navegador nas ondas do choro.  Não senti o tempo passar.
MARCELLO: Por fim, deixe uma mensagem para o Clube do Choro de Santos.
COMDTE. SAKAO: Uma palavra para turma jovem do choro. Tenha cuidado para não cair no modismo nem no comercialismo. Cultive a vernaculidade rica do Brasil. Sua terra é abençoada. Siga o seu compasso dedicadamente. Os navios ficam seguros se permanecem no porto, mas não foram feito para isso.
MARCELLO: Valeu comandante, muito obrigado pela atenção e forte abraço.
COMDTE. SAKAO:  Muito obrigado. Vamos levantar âncora!


1 Comments Add Yours ↓

  1. Renê Ruas #
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    Parabéns ao Comandante Sakao. Os comentários do Comandante valem muito mais do que as análises de alguns críticos metidos a profundos conhecedores da MPB do B. Sem soberba e com simplicidade o homem esclarece muito mais que esses bestalhões que se acham os maiorais e donos da verdade. É isso aí.



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