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Entrevista com Rene Ruas

Fotografia – Luiz Fernando Costa Ortiz.

De Caixa suspensa

“CUÍCA NO VELÓRIO – SAMBA DE ARRELIA E ARRABALDES”, obra do escritor Renê Ruas conta histórias de uma “Santos de Antigamente” na batida marcante do samba de raiz e no embalo do choro.

Sobre o autor:

Renê Rivaldo Ruas nasceu em 1949, no bairro do Marapé, em uma família de sete irmãos. Viveu sua infância brincando nas calçadas e ruas do bairro e cresceu ouvindo Choro e Chorões nas varandas e quintais.

Como qualquer jovem da década de 60 viu o tempo passar nos famosos blocos de carnaval de Santos, nas concorridas festas juninas que não existem mais em todas as comemorações que antigamente eram sinônimo de reunião familiar. Apaixonado pelas palavras, pelos livros, pela música e, em especial, pela cidade, foi levando a vida.

Há 38 anos casado com Dona Adelaide, é pai de Maira e André e avô orgulhoso de Eduardo.

Sonhou sem ser Glauber Rocha, em ser Mestre Pastinha, fundando a Academia de Capoeira Senzala com o internacionalmente reconhecido Mestre Sombra. Foi passista da Império do Samba, baliza da Embaixada de Santa Tereza, fez parte da bateria do Bloco do Boi, foi integrante do grupo de choro Regional Varandas, formado por jovens amantes do Choro (grupo do qual também participou o entrevistador). Desde 1986 toca cavaquinho e solta a voz na roda de samba e choro do tradicional “Ouro Verde” ; é diretor do Clube do Choro de Santos.

Foi no dia 3 de dezembro (6ª feira), na sede do Ouro Verde FC, na Rua 9 de Julho, 41 (hoje Rua do Samba), no Marapé, com a presença dos amigos da tradicional Roda de Samba mais antiga da cidade, dentro das comemorações em Santos do “Dia do Samba”, que Renê lançou o livro de crônicas “Cuíca no Velório– Samba de Arrelia e Arrabaldes”, pela Editora Realejo, com ilustrações de Lauro Freire e prefácio do jornalista Julinho Bittencourt, e nos concedeu essa entrevista.

Luiz Pires – Gostaríamos de começar com a tua história de vida. Como foi teu primeiro contato com os livros? Na tua família havia uma cultura do livro, ou ele se dá mais tarde na tua vida?

Rene Ruas – Na verdade os primeiros contatos com as palavras vieram através do meu pai, que foi chefe de impressão do Jornal O Diário por mais de 35 anos e a leitura diária do jornal era feita por minha mãe ou por minha vó. Depois, cursando o primário, veio o interesse pelos gibis e daí para os livros, um pulo.

Luiz Pires – Fale-nos um pouco sobre teu livro de crônicas “Cuíca no Velório – Samba de Arrelia e Arrabaldes”, pela Editora Realejo. Como surgiu a idéia inicial para a criação desta obra?

Rene Ruas – Primeiro, atendendo um convite do jornalista José Lousada, editor do site Trupe da Terra, escrevi uma crítica do CD do cantor Roberto Silva. Quase uma heresia, tal a pretensão em fazer critica musical.  Na realidade eu já vinha escrevendo algumas crônicas ou “causos” de personagens marapeanos, mas nada de concreto, somente idéias. Atendendo uma solicitação do José Lousada e com a colaboração do escritor Carlos Bittencourt escrevi de forma definitiva as primeiras crônicas que foram aprovadas por ambos. O amigo e jornalista Carlos Bittencourt me apresentou ao Editor José Luis Tahan, da Realejo, que gostou das crônicas e resolveu editar o livro.

Luiz Pires – Como você e o cartunista Lauro Freire definiram as ilustrações?

Rene Ruas – Quem definiu totalmente as ilustrações foi o cartunista Lauro Freire. Eu encaminhava as crônicas e ele desenvolvia as ilustrações com total liberdade, mesmo porque eu o Lauro já nos conhecemos há mais de 35 anos… Ele sabe como eu penso e eu sei como ele pensa.

Luiz Pires – Quais escritores foram de fundamental importância para tua formação de leitor e agora como escritor?

Rene Ruas – Aqui, sem demonstrações de intelectualismo ou coisa parecida, apenas uma constatação. Na formação de leitor, sem sombra de duvida, foram os gibis, depois já na adolescência, Monteiro Lobato, Machado de Assis, Jorge Amado, Érico Veríssimo e mais um montão de escritores. Agora, como escritor, eu leio e releio a maioria dos livros que lia na minha juventude, claro com outros olhos. Posso garantir, entretanto, que o melhor mesmo é ouvir e observar.

Luiz Pires – Você tem um grande apreço pelo choro e pelo samba. De que forma esses gêneros musicais interferem no teu fazer poético ou na tua reflexão sobre a arte de criar textos?

Rene Ruas – Eu procuro escrever minhas crônicas no andamento sincopado de um samba de breque do Moreira da Silva ou, às vezes, como um choro chorado na flauta do Pixinguinha ou no Bandolim do Jacob. É assim que é.

Luiz Pires – Se você tivesse que escolher apenas um qual seria o personagem mais marcante do teu livro?

Rene Ruas – É difícil pra caramba, escolher um personagem do livro, mesmo porque posso deixar algum deles chateado, porém, simpatizo muito com o Hilário, que, por incrível que pareça, decidiu, por conta própria, escrever a sua história.

Luiz Pires – Gostaríamos que falasses sobre o teu processo criativo. Como surgem as idéias? Onde buscas as histórias?

Rene Ruas – Bem sabes que ando muito a pé, de ônibus, e como já disse também ouço muito e observo as pessoas, assim ouço uma palavra, uma idéia, porém, na maioria das vezes, as historias estão na minha memória e é só procurar que elas surgem.

Luiz Pires – Existe uma literatura santista, ou podemos falar de uma literatura produzida em Santos?

Rene Ruas – Eu acredito numa literatura universal. Você pode ser altamente regional, escrever sobre o quitandeiro, sobre o padeiro, sei lá, mas quando você fala de sentimentos humanos, da felicidade ou da infelicidade humana, você deixa de ser regional.

Luiz Pires – Uma ex-BBB (já que isso agora é profissão) disse que o “mundo gira em torno deles”, então, muito solidária, diz que vai posar nua para ajudar a população carente. Como você encara essas sub-celebridades que chamam muito mais atenção da mídia do que escritores?

Rene Ruas – Pergunto, não discuto qualidade, quantos livros foram vendidos até agora pelo Paulo Coelho?  Teve mídia? Pergunto ainda, sem discutir qualidade, como pode ter vendido mais de um milhão de CDs o Racionais, sem nunca ter aparecido na televisão, nos jornais ou em lugar algum, que, aliás, eles se negam a aparecer até hoje, como pode? Celebridades de plantão não passam pra história. Tudo aquilo que não fala da alma das pessoas, podes crer, não entra na história, fica a reboque. É perfumaria da pior espécie. Celebridades ou “sub” não fazem parte da vida humana, não tem vida, não tem alma, são ocas, então meu caro, sem essa, não podemos perder tempo com esse tipo de bobagem.

Luiz Pires – Quais dicas você daria para os jovens escritores que desejam ingressar no meio literário?

Rene Ruas – Sem essa, eu sou um jovem escritor. A dica é a seguinte: Amigo, escreva, escreva mesmo, pois assim você pode, de certa maneira, melhorar a sua letrinha.

Luiz Pires – Existem novos projetos em pauta?

Rene Ruas – Existe sim um novo projeto, mas vamos devagar com o andor que o santo é de barro. Ainda tem muita lenha pra queimar. Vamos aguardar o resultado do Cuica no Velório.

“Cuíca no Velório – Samba de Arrelia e Arrabaldes” conta de forma bem humorada ‘causos’ de personagens santistas que vivem ou moraram no Marapé. Quem desejar encomendar o livro poderá fazê-lo diretamente na Livraria Realejo através do telefone: (13) 3289-4935 ; por e-mail: marechal@realejolivros.com.br ou com o próprio autor pelo telefone (13) 9188-3432.


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