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Jose Miguel Wisnik

Dia 8 de outubro, nas dependências da CPFL em Santos, os diretores do Clube do Choro de Santos, Luiz Antonio Pires e Marcello Laranja entrevistaram o professor de literatura, ensaista, compositor e escritor José Miguel Wisnik.

Infelizmente, por problemas técnicos no material de gravação, perdemos parte da entrevista. A partir de agora, o que conseguimos salvar.

MARCELLO: Professor Miguel Wisnik, eu, particularmente, não gosto de definições nem conceitos e, dentro de um critério bem simplista, o senhor acha também que  não conseguimos explicar o que é música, nós a sentimos e ela não é somente o simples encontro da melodia com a harmonia e o ritmo, ou seja, tem mais coisa atrás disso, não é…?

JOSÉ MIGUEL WISNIK: …a música é um fenômeno tão universal, tão concreto, ao mesmo tempo tão impalpável, que é difícil dizer o que é a música, Mas de todo o modo sempre…por isso mesmo a música…de chegar perto, de tentar dar um pouco de palavras, porque é uma linguagem não verbal, isso a gente pode concordar, é uma linguagem que se fala sem palavras e que também não pode ser medida em palavras.

MARCELLO: Pode-se dizer que a “língua mais falada no mundo” é a partitura?

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Eu não diria a partitura por que, justamente acho que temos muita música que nos chega através da oralidade, portanto, não escrita, mas é verdade que…parece que não há nenhuma sociedade conhecida que não se expresse em música, o que faz com que a gente diga que a música é tão definidora do ser humano quanto a linguagem.

MARCELLO: O senhor é daqui da baixada, é de São Vicente, e obviamente fala sobre futebol, então me diga qual é o seu time do coração…!

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Ah (risos) meu time do coração não é segredo…eu torço pelo Santos desde a final do campeonato paulista de 1956. Eu era moleque, meu pai era sampaulino e o jogo era Santos x São Paulo, eu fiquei em dúvida e resolvi ser santista. E aí fui premiado por que no ano seguinte apareceu Pelé e tudo mais, ou seja, eu sou santista de antes do Pelé.

MARCELLO: Realmente, ninguém é perfeito e o professor José Miguel Wisnik também não é (risos, muitos risos)…!

MARCELLO: Faz tempo que o senhor saiu de São Vicente, professor…?

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Sim, eu nasci e fiquei…vivi em São Vicente até os 18 anos quando eu, então, fui estudar na Faculdade de Filosofia, no curso de Letras, na USP e aí eu fiquei professor, fiquei morando em São Paulo…mas então, eu sinto uma coisa muito forte pra mim, sempre, vir a Santos ou São Vicente…foi um período muito valioso, muito rico, quer dizer, a cidade…eu tive uma excelente escola pública, havia o Festival de Música Nova que está aí, ele iniciava e era uma referência, o Madrigal Ars Viva, havia uma vida cultural muito forte…é uma cidade que não era brincadeira, não! Então, realmente, sempre me toca vir aqui para a baixada, essa cidade misturada…misturada não, mas acoplada, Santos – São Vicente.

MARCELLO: E Santos, a baixada sempre teve muita conotação…digo, expressão em política, em cultura e foi sempre uma referência para o Brasil.

JOSÉ MIGUEL WISNIK: É…! Esse período, podemos dizer que, muito da produção mais importante da música de vanguarda que se fazia na América Latina, estava em Santos, ao mesmo tempo, o melhor futebol do mundo!

MARCELLO: Sim, sem dúvida…!

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Como eu disse, ensino público de grande qualidade…! Então, isso tudo era uma coisa que é formadora, tudo o que eu vim a fazer depois…esse livro sobre futebol, como digo antes até, tem um depoimento sobre isso, sobre o futebol na baixada santista, nos vários níveis, futebol de praia, de várzea, assim como a música e a literatura são as minhas atividades, elas estão muito ligadas a essa formação, a esse período formativo, por que na escola em que eu estudei tive excelentes professores de literatura, estudava música e tinha uma vida musical e estava assistindo futebol. Depois eu me tornei uma pessoa que justamente trabalha com literatura, música e futebol.

MARCELLO: Enaltecendo essa postura do ensino, o senhor lembra do colégio em que estudou…?

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Estudei no Martim Afonso…a escola tinha atividades teatrais, aliás Santos tinha uma atividade teatral forte, atores como Ney Latorraca, Alexandre Borges…

MARCELLO: Sérgio Mamberti…

LUIZ PIRES: Inclusive em São Vicente, no antigo Grupão, estudou a atriz Cacilda Becker, que também viveu muitos anos em Santos.

MARCELLO: Quantos livros lançados até hoje, professor…!

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Eu tenho um livro sobre a música na Semana de Arte Moderna chamado “O Coro dos Contrários”, tenho um livro sobre música chamado “O som e o sentido”, uma outra história das músicas; tenho um livro de ensaios sobre música e literatura chamado “Sem receita, ensaios e canções”, tenho um livro sobre futebol, tenho um ensaio sobre Machado de Assis e a música que se chama “Machado Maxixe: O Caso Pestana”, também organizei uma antologia sobre as coisas de Gregório de Matos, participei de muitos livros coletivos como “Os sentidos da paixão”…!

A partir deste momento, nosso companheiro vice-presidente Luiz Pires assume o comando da entrevista.

Infelizmente, a partir daqui perdemos, praticamente quase toda a entrevista…!

LUIZ PIRES: (…………)

JOSÉ MIGUEL WISNIK: …então eu estava dizendo sobre o Ernesto Nazaré…ele atravessou cinquenta anos de produção, momentos assim fundamentais da formação da música popular urbana. Ele faz, inicialmente, polcas, mas essas polcas são amaxixadas por que o conceito de Maxixe existia desde 1870, mas era ligado aos bailes populares e ao Teatro de Revista e não era considerado um gênero familiar que você pudesse levar pra casa…!

LUIZ PIRES: Talvez por isso a utilização da nomenclatura de Tango Brasileiro…!

JOSÉ MIGUEL WISNIK : Exatamente…! Porque…! Você pode dizer que ele fazia Maxixes, mas não admitia, não é, por causa também disso. A primeira vez que se publicou uma partitura escrito “Maxixe” foi em 1898, já dez anos depois da abolição da escravidão, aquilo ainda parecia uma coisa que era música de pobres, de escravos, de negros etc. E aquilo era, ao mesmo tempo, fascinante, mas não se podia admitir esse fascínio e a música do Ernesto Nazaré está bem nessa passagem…

MARCELLO: A própria Chiquinha Gonzaga não usava a expressão “Maxixe” por causa da condição de ser uma dança execrada pela sociedade carioca…!

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Mas, ao mesmo tempo, o Ernesto Nazaré é um pianista que tocou…conhecia Chopin e tal, tanto é que ele escreveu Schubert, ele escreveu um improviso de concerto que dedicou a Villa-Lobos muito bem escrito, uma marcha fúnebre que tem algo a ver com a de Chopin, então, ele…e depois era um músico da escrita, não era um músico da, vamos dizer, de músicas que entram para a tradição oral simplesmente, por que a partitura tal como ele escreve é alguma coisa muito especial. Então, por exemplo, ele tem composições que a mão esquerda é que canta a melodia, enquanto a mão direita vai fazendo o acompanhamento, como o “Odeon”, que está ligado a uma espécie de  estilização das frases de um violão de 7 cordas transpostas para o piano na mão esquerda, enquanto a mão direita é que faz acordes de acompanhamento. Isso é uma coisa de um pianismo clássico, assim como “Rayon D’Or” é uma outra peça que a mão esquerda é que canta a melodia, o fato dele estilizar também a flauta como em “Apanhei-te cavaquinho”, a flauta e o cavaquinho, tem várias músicas que você tem, como se fossem várias…é uma textura como se fosse várias camadas de música acontecendo, como a polca “Cruz perigo”, por exemplo, a mão esquerda é polca, mas a mão direita é maxixe, você soma as duas…é das primeiras que ele fez. Então isso é interessantíssimo e é um compositor muito especial por tudo isso e, então, era um compositor popular, mas de músicas que se tornaram clássicas em dois sentidos, um por que são clássicos da música popular que estão na nossa memória coletiva…Mário de Andrade escrevia “é curioso que ele tenha se tornado esse homem célebre que é e tão popular, sendo que ele é o mais complexo compositor, o mais refinado, como é que tão refinado e com tanto alcance”. Por outro lado também, ele acabou sendo adotado pelos pianistas de concerto, entrou para o repertório de concertos. Então, a fronteira do erudito e popular é atravessada pela obra do Nazaré.

LUIZ PIRES: Inclusive há também similaridade até com o Ragtime, o Scott Joplin, a música negra norte-americana…!

JOSÉ MIGUEL WISNIK: É, eu acho que a gente vê grande afinidade, embora eu não ache que ele conhecesse, quer dizer, até onde eu sei! Agora, eu acho que tudo isso está ligado a um encontro de música européia, de polca com música africana no território das Américas que deu Ragtime, Habanera e Maxixe.

LUIZ PIRES: Professor, para encerrar, seus projetos para livro e CD..!

JOSÉ MIGUEL WISNIK: Eu quero gravar um CD agora, é o que eu estou empenhado em fazer, mas também tem um projeto de livros sobre Machado de Assis, não sobre música, contos de Machado de Assis e sobre Guimarães Rosa por outro lado, e também um livro sobre a Canção Popular que vai se chamar “O fim da canção”, mas que não é  pra dizer que a canção terminou, mas é que o fim da canção é não ter fim.

Agradecemos a extrema amabilidade e simpatia com que o professor José Miguel Wisnik nos recebeu, concedendo-nos essa entrevista. Só não prosseguimos em razão do compromisso assumido anteriormente. O nobre professor proferiu palestra “Eu que aprenda a levitar” no auditório lotado da CPFL dentro do Projeto Café Filosófico.

Queremos registrar também nosso sincero agradecimento à jornalista e produtora Ana Luiza Saraiva Nunes que, da mesma forma, nos recebeu com extrema amibilidade e simpatia e também ao diretor de comunicação da CPFL ENERGIA, Augusto Rodrigues, responsável pela CPFL CULTURA.