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ENTREVISTA CONCEDIDA PELO MESTRE ROBERTO SILVA, O “PRINCIPE DO SAMBA”, AOS COMPANHEIROS DO CLUBE DO CHORO DE SANTOS…!

O encontro ocorreu em 24 junho de 2010 no apartamento do Carina Flat Hotel Santos na Rua Ministro João Mendes, 217, Aparecida, onde estavam hospedados Roberto Silva e sua esposa e produtora Syone Costa. Ambos, gentilmente, nos receberam para um bate-papo super descontraído.

O sambista veio a Santos para se apresentar no teatro do SESC ao lado de Tuco e Batalhão de Sambistas…!

Por problemas técnicos, tivemos dificuldades em capturar a entrevista que só foi possível graças ao empenho e a boa-vontade do nosso diretor secretário Renê Ruas. Foi transcrita com absoluta fidelidade e aqui está ela, na íntegra…!

Participaram da entrevista formulando perguntas, além do já mencionado companheiro Renê, Luiz Pires, Tuco (Fernando Pellegrino) e sua esposa Noeli e Marcello Laranja…!

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Nos anos 30/40 até o final dos anos 50, início dos 60, na época de ouro do Rádio havia os grandes cantores, o chamado cantor de ofício, Nuno Roland, Déo, Roberto Silva, Cyro Monteiro, Orlando Silva e tantos outros. Quando surge a bossa nova e os festivais de música, surge também a figura do compositor-cantor, deixando de lado o cantor de ofício como o senhor e Paulo Marquês, por exemplo. Nos tempos de hoje ainda há espaço para o cantor de ofício?

ROBERTO SILVA – Eu tenho pra mim que esses cantores se tornaram os chamados “de ofício” depois que foram contratados pelas estações de rádio e pelas gravadoras. Assim, contratados, eles tinham um emprego, um ofício, com um contrato ou uma carteira assinada, ordenado muito bom. Até certo ponto era um ofício. Agora, os autores mostravam suas músicas, mas muitos deles gostavam de cantar também. Conforme mostravam para os cantores eles cantavam com aquela voz diferente do cantor. Era o que existia naquela época. Não sei se é isso.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – É isso…os grandes cantores se formavam na rádio…!

ROBERTO SILVA – Exatamente…era a profissão deles…!

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Era cantor de ofício mesmo…ele cantava…raramente era compositor…!

ROBERTO SILVA – Isso é verdade…compositor era completamente diferente…!

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – O senhor pegou toda aquela era do início de rádio, o senhor se habituou, já se acostumou com toda essa mudança tecnológica, quer dizer, acredita que ainda há futuro para a música nas rádios, CD…?

ROBERTO SILVA – Olha os bons tempos da música praticamente já passaram, era no tempo que existia o rádio, o rádio era uma coisa fora de série, era um respeito, né…? E agora praticamente o rádio já está, coitado, desaparecendo, a divulgação das musicas exatamente agora só pela televisão. A televisão que paga a divulgação…essa coisa toda…por que eu acho que agora jamais virá bons tempos do rádio…como era aquela coisa que eu gravava e dali há 15 dias era aquele maior sucesso… todas as rádios tocando aquela coisa toda…então desapareceu tudo. O que nós temos agora é praticamente a televisão ajudando, divulgando bem, coisa e tal…!

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Como o senhor vê essa rapaziada, como o Tuco, por exemplo, garotos de tudo, com 30, 35 anos que são seus fãs? Eu vi o senhor no programa Ensaio da TV Cultura sendo acompanhado por aqueles meninos. Como o senhor vê essa garotada acompanhando o senhor…? Tem explicação essa paixão pelo Roberto Silva…?

ROBERTO SILVA – Gosto muito e fico feliz. Eu vejo, lembro-me bem, de cantores jovens como Caetano Veloso, Paulinho da Viola, Zeca Pagodinho sempre me prestigiando, perguntando sobre a minha música, querendo ouvir a minha música. O show que estou é aquela alegria. Eu acho que eles estão dando continuação ao nosso samba, à nossa música. O nosso ritmo. A respeito do pagode, ele é o filho do samba. O samba tem mais balanço, a jogada é diferente. Está tudo dentro de casa. Eu acho que o samba jamais morrerá. Para mim nunca desaparecerá.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – O Tuco é um menino, como o senhor vê…!

ROBERTO SILVA – O Tuco é maravilhoso, vai fazer grande sucesso, um menino de ouro.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Existe alguma diferença entre o samba de São Paulo e do Rio de Janeiro…?

ROBERTO SILVA – O samba do Rio de Janeiro e de São Paulo são iguais. O mesmo ritmo, o mesmo andamento, movimento. Agora, São Paulo tem Escolas de Samba maravilhosas. Eu acho que não há diferença nenhuma. Empate. Dez a Dez.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – De sua discografia quais os títulos que o senhor mais gosta…!

ROBERTO SILVA – Tem a série do “Descendo o morro”. Uma série de serestas e canções que eu gosto muito.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Desses trabalhos tem alguma coisa ou fato interessante que o senhor possa contar para nós…?

ROBERTO SILVA – Engraçado não é, porque o Ciro Monteiro na ocasião em que morreu o compositor Geraldo Pereira que era muito seu amigo, durante o velório, estava do lado do caixão muito triste com os olhos cheiros de lágrimas, olhando o falecido quando chegou um amigo seu, um mulatinho, e, bem perto dele falou: Ô Ciro que coincidência heim…? O Ciro, não entendendo nada, foi para fora e começou a rir e a chorar da situação ao mesmo tempo. Ciro era maravilhoso. Na ocasião que ele morreu, quando estava adoentado internado no hospital e estava passando muito mal quando chegaram os enfermeiros e médicos e perguntaram: como é seu nome, como é seu nome…? Ele respondeu brincando: Roberto Carlos. Pois é, até pra morrer o Ciro fazia brincadeira.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – E aquela história do Geraldo Pereira com o Madame Satã, for verdade mesmo…?

ROBERTO SILVA – Eram amigos mas acabaram brigando. O Madame Satã era lutador, valentão. O Geraldo não. Era uma pessoa legal, compositor. Houve esta briga entre os dois e o Madame Satã machucou o Geraldo que acabou morrendo. Madame Satã tempos depois acabou morrendo também. A vida é assim.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – A vida ou a carreira do Geraldo Pereira que era um excelente compositor ficou marcada por esse episódio lamentável…? Este episódio foi determinante na sua carreira…?

ROBERTO SILVA – O meu filho mais velho tem 68 anos e eu já estou com a memória um pouco fraca.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Como foi sua passagem pela Rádio Nacional…!

ROBERTO SILVA – O Evaldo Ruy era o Diretor da Rádio Mauá e estava terminando o meu contrato quando o Haroldo Barbosa, diretor da Rádio Nacional, falou comigo dizendo: Roberto está terminando o teu contrato na Mauá e eu vou te levar para uma rádio maior e a divulgação será maior também. Aí o Evaldo falou com seu irmão que era diretor da Nacional. Eu fiquei na Nacional um ano e meio e no término do meu contrato o Paulo Gracindo que era muito meu amigo e que tinha saído da Rádio Nacional para a Rádio Tupi, dirigindo o programa Sequencia de Três pediu que eu não renovasse o contrato com a Nacional, dizendo que eu teria maiores oportunidades, porque naquela época a Rádio Nacional tinha todos os grandes cantores e, eu, coitadinho, estava no início de carreira, engatinhando. Então eu disse, está bem Paulo, pode deixar quando faltar uns 15 dias para terminar o contrato e o Haroldo me chamar para renovação e vou dizer que não quero pois vou viajar, foi quando eu fui para a Rádio Tupi, em 1949. Lá então o Paulo fez o meu primeiro contrato. Antigamente era assim, no primeiro contrato, se não fizesse sucesso o contrato era rescindido. Bem, tudo bem explodi, fiz sucesso e fiquei por 16 anos na Tupi. Eu fiz minha caminhada na Tupi. Depois sai e fui para a Mayrink Veiga.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Como foi sua convivência com o Ary Barroso…! O senhor se deu bem com ele…?

ROBERTO SILVA – Foi boa. Ary teve uma carreira maravilhosa na Tupi. Gente boa. O programa de calouro dele era maravilhoso.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Como é que o senhor vê o samba hoje…! Como dizia o Billy Blanco. O samba pra ser samba na batata ou ele é só pagode mais que outra coisa…!

ROBERTO SILVA – O samba é o samba mesmo e está aí até hoje. Você vê sou um sambista que estou com essa idade e sou procurado para cantar no Brasil inteiro.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Mas o senhor não canta pagode…!

ROBERTO SILVA – Se me der eu canto. Eu canto de tudo, qualquer gênero, valsa, samba canção. Tem uns aí que vão me derrubar. O Tuco é um sambista muito bom. Amanhã nós estaremos juntos no palco…!

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – Como o senhor consegue cantar ainda no mesmo tom que cantava quando gravava há muito tempo atrás…!

ROBERTO SILVA – Quando faço minhas programações, minha mulher faz o repertório com os tons já programados.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – O Ciro Monteiro chamava o Geraldo Pereira de Coqueiro porque ele era muito alto…? Como era isso…!

ROBERTO SILVA – O Ciro era uma criatura encantadora. Você vê, ele doente pra morrer e disse pro médico que o nome dele era Roberto Carlos. Sabe como era meu apelido? Mistura Fina. Eu era muito magrinho e andava de terno branco. O pessoal me procurava e o Ciro falava: Quem? O Mistura Fina? O apelido dele era formigão.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – O senhor teve algum contato com o Vassourinha…?

ROBERTO SILVA – Ele era um cantor de São Paulo, morreu muito novinho e fez carreira em São Paulo.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – O Cartola chegou a cantar na Radio Nacional…?

ROBERTO SILVA – Ele não trabalhava na Rádio Nacional, não tinha contrato, fazia um trabalhinho e ganhava um cachezinho.

CLUBE DO CHORO DE SANTOS – O senhor lembra um problema, na Radio Nacional, entre o Paulo da Portela e o Cartola…?

ROBERTO SILVA – Não, eles eram muito amigos. Vou contar uma coisa para vocês. O sambista, os autores de Escola de Samba não tinham acesso nas rádios, eles não tinham autorização para entrar nas rádios. A diretoria não deixava porque diziam que eles eram de nível abaixo, que eram pessoas de baixo nível. No entanto não eram. Tinha gente muito boa. Eles não podiam entrar na rádio. Se fosse falar com algum amigo na rádio tinha que esperar lá embaixo…se um Diretor soubesse que você estivesse que negociando música era chamado a atenção. E o que aconteceu…? O rádio, no Rio de Janeiro, praticamente acabou, não existe mais. As Escolas de Samba subiram e hoje fazem a divulgação dos autores. Você não escuta mais musica nas rádios. Antigamente chegava o Carnaval e já tinha o disco pré-carnavalesco, três meses era o pré e depois vinha o outro para arrebentar. Hoje é a Escola de Samba que relembra esse passado nosso. O Carnaval era uma coisa. Eram muitos sucessos de qualidade. Aqueles compositores em cima do palco. Agora acabou. “SYONE, A ESPOSA DO ROBERTO SILVA PEDIU PRA ELE CONTAR UMA HISTÓRIA”…!

ROBERTO SILVA – Na noite que eu estava gravando um LP aconteceu uma história muito triste. Na Copacabana eu gravava direto, começava as oito da noite e terminava na alta madrugada. Fui pra fábrica gravar. Fui gravar as faixas, lá pelas quatro da manhã a última musica foi “Agora é Cinza” – “você partiu saudades me deixou eu chorei”…Fui pra casa. Quando chego em casa minha esposa abre a porta e disse: tenho uma notícia muito triste pra te dar. Eu estou cansado e agora você vai me dar uma notícia triste. Pois é. Minha mãe faleceu, ela não tinha nada, isso em 1954. Deu um derrame e levou minha mãe. “Você partiu de madrugada, não me disse nada, isso não se faz”…! Fiquei muito tempo sem cantar essa música, hoje consigo até cantar, mas me segurando.

Lamentamos também a perda das fotos que foram tiradas na ocasião…!

Participaram da entrevista formulando perguntas, além do já mencionado companheiro René, o vice-presidente Luiz Pires, Tuco (Fernando Pellegrino) e sua esposa Eloá e Marcello Laranja…!

Quis o destino que o mestre Roberto Silva não visse a entrevista publicada em razão do seu falecimento recente, o Criador tirou o “Príncipe do Samba” do nosso convívio…!

Além da entrevista, confiram as imagens e o vídeo…!

Abraços

 


4 Comments Add Yours ↓

  1. syone costa #
    1

    Prezado Marcello

    Assim como a música Agora é Cinza, pregou uma peça no Roberto no dia em que a mãe dele faleceu, por ironia do destino também aconteceu comigo….ele partiu de madrugada, depois de passar parte da tarde conversando comigo, dizendo que jamais iria me esquecer, que me amava muito e que ainda faríamos muitas apresentações pelo Brasil; às 4:00 da manhã ele se foi….
    Agradeço pela gentileza do envio da entrevista.
    Um grande abraço.
    Syone

  2. 2

    Excelente entrevista. Simples. Sincera. Espontânea. Tenho muita coisa do consagrado Roberto Silva. Ele é de valor eterno.

    Aguinaldo Loyo Bechelli, escritor, cronista e percussionista.

  3. 3

    Bonito trabalho esse feito com o Roberto Silva, acompanhado dos filmes de sua apresentação.
    Ele foi ético ao fazer a declaração que na época da bossa nova alguns daqueles que apareceram tinham qualidade como compositores, porém, não como cantores. Na verdade, foram ocupando o espaço dos verdadeiros cantores da musica popular brasileira.

    Luiz Simões Polaco Filho, diretor jurídico do Clube do Choro de Santos.

  4. 4

    Registro importante…!

    Guta do pandeiro



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