RSS

ENTREVISTA COM MÁRIO ALBANESE PARA O BLOG DO CLUBE DO CHORO DE SANTOS


Entrevista para o blog do Clube do Choro de Santos com o pianista, compositor, arranjador e maestro paulistano Mário Albanese que no último dia 31 de outubro de 2011 completou 80 anos de idade…!
 

1 - MARCELLO: Mário, em que condições surgiu a idéia da criação do JEQUIBAU…!
MARIO ALBANESE: Casado e com dois filhos, dos cinco que tivemos, eu estava afastado do meio artístico quando recebi a visita de Brás Baccarin, diretor da gravadora Chantecler e do cantor Paulo Queiroz, um apreciador incondicional das minhas músicas e que morreu em um trágico acidente de carro juntamente com Teddy Vieira. O objetivo da visita era me persuadir a criar algo novo que desse à Chantecler a oportunidade de ingressar na faixa comercial da música que tinha como parâmetro a bossa nova. É importante revelar que o diretor artístico da gravadora era Diogo Mulero, um criador de sucessos e integrante da dupla Palmeira e Biá,. Expliquei aos dois amigos que, embora afastado do meio, dei continuidade ao meu espírito investigativo e estava naquela oportunidade trabalhando em algo fora da ambivalência e da quadratura, portanto, no caminho oposto da corrente comercial. Ofereceu-me condições de estúdio e o que mais precisasse como respaldo.
As forças ocultas colaboraram e eu voltei para o rádio e televisão, bem como para a imprensa. Nesse retorno e na Rádio Excelsior organizei, tendo como suporte, o Programa O Assunto é Violão, um inédito Concurso para Violonistas Amadores clássicos e populares, tanto adultos como infanto-juvenis. O resultado foi auspicioso e revelou da música clássica: Noé dos Santos, Henrique Pinto e Antonio Carlos Sarno; do setor infanto-juvenil: Odair Assad Simão, Wanda Regina Castilho e Eduardo Terrazan; da música popular: Sérgio Assad Simão, Eduardo Gudin e Humberto Neri. Você, Marcello Laranja, que vive intensamente o meio violonístico sabe da notoriedade, valor e reconhecimento de quase todos os premiados.
Ao deixar a Excelsior fui para a rádio Record, reencontrei o Ciro e falei do projeto a que estava me dedicando.
2 – MARCELLO: Como se deu o encontro com seu parceiro, compadre e amigo maestro Cyro Pereira…!
MÁRIO ALBANESE: O Ciro me foi apresentado pelo inesquecível Garoto, Aníbal Augusto Sardinha, na Rádio Record, ainda na Rua Quintino Bocaiuva nos anos 50. Àquela época, no meio radiofônico, as músicas não eram escritas sendo apresentadas pelo autor tocando, cantando ou numa gravação em minicassete caseiro. Assim e nessas condições, a importância do arranjador se evidenciava na estrutura final da composição ao agregar introdução, harmonia e ritmo, criando a partitura. Em um artigo sobre o Ciro Pereira, publicado no jornal Hora de São Paulo, em 1982, destaquei a importância do arranjador e a necessidade de reconhecer, como legítimo, o direito conexo a que faz jus.
Nesse sentido e com essa ótica o Ciro produziu um programa intitulado o Maestro Veste a Música, para explicar com detalhes a instrumentação utilizada e os efeitos produzidos. Lembro-me que  INSÔNIA, de minha autoria, com letra de Heitor Carillo, foi dissecada pelo Ciro nesse programa, sem imaginar que no futuro seríamos parceiros. Dessa proximidade resultou a gravação de SOL, de minha autoria, gravada pela Continental no LP Música dos Astros, PPL 12014, com Ciro e Orquestra.
O fato curioso foi o expediente utilizado pela gravadora de lançar esse mesmo disco mudando o título para ROMÂNTICOS DEL CARIBE, como contraponto ao sucesso obtido pelos Românticos de Cuba. A música SOL ganhou letra de Jorge Duarte bem como outras gravações, além da minha, Pedrinho Mattar ao piano, do cantor Wilson Miranda, e do violonista Pierre. Sem dúvida, o convívio diário com o Ciro nos anos sessenta foi produtivo. Eu o reencontrei na Rádio e TV Record instaladas na Av. Miruna, perto do aeroporto de Congonhas, num momento especial, pois os Maestros Gabriel Migliori, Hervé Cordovil, Zico Mazagão e Ciro Pereira, estavam com folga no trabalho em razão das radicais mudanças realizadas na grade de programação da emissora.
Assim tivemos horas produtivas para conciliar e ajustar nossas ideias que resultaram no JEQUIBAU, uma inovação autêntica que conseguiu, tal qual rastilho de pólvora, enorme repercussão nos EUA, consubstanciada nas gravações de renomados artistas e na inserção em métodos de ensino.
Vencedor de concursos internacionais sua expansão mereceu registros em matérias publicadas por revistas e jornais especializados do mundo.

MÁRIO ALBANESE E CYRO PEREIRA

 

3 – MARCELLO: Explique-nos o que significa a expressão JEQUIBAU e de onde vem…!

MÁRIO ALBANESE: Do álbum de músicas editado em 1966 pela Peer International Corporation dos EUA, Jequibau, The Exciting Rhythm From Brazil, no prefácio o Mº George Barnes foi incisivo: Este maravilhoso e novo ritmo brasileiro é o primeiro 5/4 com uma pulsação verdadeira (This wonderful new brazilian born rhythm is the first 5/4 with a true pulse). Com dez (10) músicas originais de Mário Albanese e Ciro Pereira, arranjadas para piano pelo Mº George Cole que ajuizou o Jequibau como uma fórmula verdadeira de cinco tempos (Jequibau is a true five beat form).
Lançado em 23 países simultaneamente contendo, além da partitura, a anotação cifrada dos acordes e, o rhythm digest, síntese de como o ritmo se comporta para ser jequibau. Assim, tendo como base a melodia, estão especificadas as funções da guitarra, do baixo e da bateria. Curiosamente são cinco (5) desenhos diferentes que se entrelaçam harmoniosamente gerando uma seqüência que flui com espontaneidade.
Observe-se que no LP de lançamento do Jequibau, piano e orquestra de cordas, o ritmo não se sobrepõe é insinuado e faz parte do contexto melódico e harmônico. Normalmente, quando se fala em ritmo a percepção comum é de uma batida predominante e percussiva.
Jequibau é diferente até por esse aspecto e, por isso, é sugestivo. O cordão umbilical de tudo acaba sendo sempre o folclore onde os pesquisadores, Mário Albanese e Ciro Pereira, encontraram várias estruturas diferentes de ritmo no candomblé, um culto afro-brasileiro. Joeirado na riqueza do rico folclore do país os músicos  garimparam também um compasso de cinco tempos no fio melódico de uma Cantiga de Roda. Constataram ainda que na tradição do folclore argentino a dança Los Amores se desenvolve na alternância de compassos de dois (2) e três (3) tempos. Na música popular Take Five, de Paul Desmond, estrutura-se no esquema 3 e 2.
Missão Impossível, do argentino Lalo Schifrin idem.
Assim, é ilógico  reconhecer uma seqüência alternada de dois compassos diferentes e entendê-los  como sendo um!
4 – MARCELLO: O JEQUIBAU, além da grande aceitação, foi gravado no exterior também, certo…? Fale-nos a respeito disso, quais os grandes nomes da música popular internacional que gravaram e quais as entidades que o reconheceram…!
MÁRIO ALBANESE: Caríssimo Marcello. A Editora  Peer International Corporation dos EUA,  que iniciou esse processo continuado de reconhecimento merece destaque ao publicar um álbum com dez (10) músicas originais de nossa autoria (MA e CP) com um diagnóstico ritmico, e lançá-lo simultaneamente em vinte e três (23) países. De extraordinário valor e significado o reconhecimento da ABF – Associação Brasileira de Folclore revelado nas palavras do eminente Professor Rossini Tavares de Lima: O jequibau, ritmobrasileiro de inspiração folclórica que ora alcança sucesso no estrangeiro, especialmente nos Estados Unidos, é testemunho vivo da importância do folclore na concepção de música popular brasileira. Uma criatura que ignora canções de roda, advinhações, brincadeiras, mitos que encantaram nossa infância, está divorciadada da vida porque renega a região em que nasceu e seus conterrâneos. O fato aconteceu em 1969 e foi registrado pela Folha de São Paulo aos 26 dias de março como seguinte texto: ABF – Associação Brasileira de Folclore recebe Albanese, seu mais novo membro. Dos sessenta (60) membros da entidade, Mário Albanese é o único representante da musica popular distinguido com a honraria.
Foi recepcionado pelo Professor Rossini Tavares de Lima. Além da Folha, o jornalista Antonio Gusmán do Diário da Noite de sexta-feira, 09 de maio de 69, destacou: ABF acolhe Mário Albanese. O Cash Box em edição de aniversário (Anniversary Edition , July 5,1969) noticiou qu Mário Albanese, criador do ritmo jequibau, foi eleito Membro Efetivo da Associação Brasileira de Folclore. Na sequência o jequibau foi reconhecido pela SBCD – Sociedade Brasileira de Cultura e Desenvolvimento, APEMA – Associação dos Professores de Educação Musical e Artística e também por congêneres de outros países.
Afirmo, sem falsa modéstia, que as expressões de reconhecimento vindas do exterior foram imediatas, circunstância que ratificou, ainda mais, minha convicção do seu ineditismo.  Esse saber ingênito, produziu curandeiros, pajés e adivinhos, todos dotados de um dom  natural, nascido com o individuo.
JEQUIBAU - MÁRIO ALBANESE E CYRO PEREIRA
5 – MARCELLO: E o que você acha sobre a antiga discussão sobre “Erudito” e “Popular”, existe diferença entre ambos…? O maestro Heitor Villa Lobos, há muitos anos atrás, dizia que não, música era uma coisa só…!
MÁRIO ALBANESE: A música, independentemente da sua conceituação como erudita ou popular, como vibração sonora é uma poderosa força para promover mudanças, se utilizada com propósitos espirituais compatíveis. Não há como não ouvir o que se oferece em termos de música. Sob o domínio da Igreja a música foi sacralizada, fato que não impediu que, fora de sua ingerência, tivesse desenvoltura junto ao povo para provocar reações instintivas e desencadear trejeiros de variados  impulsos ocasionados pelo ritmo predominante.  Diante desse quadro torna-se compreensível o domínio do rock  caracterizado pelos desenhos musicais repetitivos, tão rejeitados pelo erudito. Popular e erudito são termos com diferenças metafóricas, de subjetiva transposição e significado. Mozart, não achava indigno de sua estatura compor dezenas de danças, divertimentos, serenatas e noturnos. Portanto essa conceituação depende muito da maneira como se encara a música.  Ao entender que a música nasce do binômio silêncio-som é possível compreender que um músico leia uma partitura musical ouvindo subjetivamente os sons em silêncio e distante de um instrumento, fato que  ocorre com os músicos  de ouvido apurado e que cursaram escola de música. Antigamente aprendia-se música por audição, de ouvido.  A partir dessa experimentação surgiram várias formas de preservar na memória a lembrança do som. A Notação Neumática auxiliava o músico a relembrar o trecho musical que já conhecia.  Neumas são sinais originados da língua grega semelhantes aos da taquigrafia e muito utilizados no cantochão.  Serviam para indicar onde a voz deveria alterar-se para cima ou para baixo, sem registrar precisamente a altura e a duração do som.  Também na Grécia.  O Sistema Literal, usando as primeiras letras do alfabeto grego, foi preservado até a Idade Média (476 a 1453), quando foram substituídas pelas letras latinas.
Releve-se que a difusão do conhecimento dinamizou-se a partir da invenção da imprensa por Johann Gutenberg (1398 – 1468) autor do primeiro livro impresso, a Bíblia de Gutenberg, possivelmente em 1454. Antes disso, a intelectualidade e a cultura, por 20 séculos de ininterrupta unidade, concentravam-se na Igreja Católica. Foi o músico e monge beneditino, Guido d’ Arezzo, que elaborou o Sistema de Notação Musical que se conhece. Guido d’ Arezzo nasceu e viveu de 995 a 1050 na cidade de Arezzo, Itália.  Inteligente e criativo deu nome às notas utilizando as primeiras sílabas dos seis versos do Hino a São João Batista, caracterizando um acróstico. UT queant laxix / REsonare fibris / MIra gestorum / FAmuli tuorum / SOLve polluti / LAbii reatum / Sancte Ioannes.  Para que possam / Nossas vozes / Cantar seus / Admiráveis feitos / Guia os lábios / Dos teus servos / Ó São João. Acróstico caracteriza-se pelo aproveitamento vertical das letras iniciais para formar uma frase ou palavras.
A nota SI surgiu somente no século XVII e pela junção das iniciais de Sancte Ioannes. Durante séculos o sétimo grau da escala não teve designação especial. Pela difícil adaptação do UT ao canto italiano foi substituído pelo DÓ.
Na língua francesa o UT é ainda usado. Atualmente o músico de instrumento acústico compete com o engenheiro de som e DJs que não têm vínculo com a música tonal e não são instrumentistas, tudo é programado em computador ou aproveitando Lps já produzidos. Com esse expediente, acredita-se que a música sobreviverá em salas, auditórios e nichos ocasionais adaptados para uma pequena e interessada audiência.
6 – MARCELLO: E seu grande amigo e parceiro maestro Cyro Pereira, lamentavel e recentemente falecido, o que ele significa na sua vida e na sua carreira, tanto como pessoa humana quanto regente, arranjador e compositor…!
MÁRIO ALBANESE: Cyro Marin Pereira (14.08.1930 -  09.06.2011)
Amigo dileto,  parceiro no Jequibau e em 35 composições, além de compadre por eu ser  padrinho de crisma do Carlos Pereira, gêmeo da Luciana e irmão do primogênito Cirinho. À comadre Ester de Souza, que praticamente renunciou à sua condição de grande cantora, para ser esposa por 60 anos de matrimônio, minha solidariedade.
Nosso elo de amizade e compadrio foi, pelo que se percebe,  alimentado pela música. Em nossas jornadas de trabalho o convívio sempre foi de extremo respeito às diferenças naturais de educação, linhagem musical e até de comprometimento profissional.
Juntos percebemos, por osmose, que os axiomas da música, quando fundamentados numa proposta autêntica, acabam se consolidando. O  trabalho de pesquisa, joeirado no folclore, nos levou ao jequibau: cinco (5) tempos por compasso com uma pulsação própria  e verdadeira., o 5/4 brasileiro!   Depois desse objetivo conquistado lutamos para vencer os obstáculos naturais da incompreensão diante de algo novo e inusitado.
Agora, sem o Ciro, resta-me a esperança de que a luz que nos  iluminou durante 46 anos de parceria, sirva de alento e inspiração  para os meus 80 anos de vida.
MÁRIO ALBANESE (CAPA DO LP)
7 – MARCELLO: “Gamboa”, “Fim de semana em Guarujá” e “No balanço do Jequibau” são algumas de suas composições em parceria com o maestro. Cite-nos os nomes de outras composições e, na sua opinião, qual a que você mais gosta.
MÁRIO ALBANESE: Marcello. Eis aí a relação de composições criadas em parceria com Ciro Pereira: 1. Acordar de Um Novo Dia. 2. Baobá. 3.Carango (MA, CP e Jorge Lemos). 4. Certa Vez. Cinzas. 5. Ciranda. 6. Contato (MA, CP e Cláudia). 7. Espanta o Grilo (MA. CP e Cláudia). 8. Esperando o Sol. 9. Eu Agora Sei Amar. 10. Fim de Semana em Guarujá. 11. Foi Assim. 12. Gamboa (MA, CP e Robson Miguel). 13. Gosto de Ser Como Sou. 14. Imaginação. 15. Integração (MS, CP e Jorge Lemos). 15.Jequi-Bach. 16. Jequibau. 17. Longe de Você. 18. Macumba (MA. CP, Nancy L Miranda). 19. Malabô. 20. Maré Alta. Modulando. 21. Não Posso Esquecer. 22. No Balanço do Jequibau. 23. O Amanhã de Nosso Amor. 24. O Caminho das Estrelas. 25. O Fim. 26. Para Sempre. 27. Por Um Trís. 28 Sim. 29. Sonhando Azul. 30. Sumaúma. 31. Tarde Quente. 32. Transamazônica (MA. CP. Jorge Lemos). 33. Um Amor Sem Igual. 34. Vida Roubada. 35. Zambo. Toda composição no meu modo de entender tem um significado intrínseco e essência própria. Portanto, um juízo de valor na música exige que se faça uma íntima relação entre beleza, autenticidade e intenção. Tendo isso em mente escolho como predileta a música Jequibau porque é transcendente e paradigma de um gênero inovador.
8 – MARCELLO: Então, dentro desse rol de composições, você classificaria “Jequibau” como sua composição predileta…?
MÁRIO ALBANESE: A música predileta é Jequibau, criada ainda sem a perspectiva que consolidou e repercutiu o ritmo jequibau. Seu fio melódico, de instigante originalidade, caminha por intervalos embrenhando-se em densa harmonia e com o estímulo sutil do ritmo quinário.
Comandada pelo violão do inesquecível amigo Poly (Ângelo Apolônio), tendo ainda Gabriel Bahlis no baixo e Turquinho (José Rezala) na bateria, o setor percussivo  teve uma ação prudente e comedida bem de acordo com a formação de uma orquestra à base de cordas. Àquela época, os músicos de estúdio, liam à primeira vista as composições que iriam gravar. Essa histórica gravação foi realizada depois da meia noite e no estúdio da Rádio Bandeirantes, na Rua Paula Souza.
Ao final fomos para o Ponto dos Músicos, concentrado no Bar Avenida, localizado na confluência da Av. São João com a Av. Ipiranga, que tinha o Bar do Jeca do outro lado da São João. O zum-zum e os comentários sobre o novo ritmo foram de entusiasmar. Foi um prenúncio do que realmente acabou acontecendo.
Já se passaram 47 anos e o Jequibau continua firme e forte, como um fato de vitoriosa realização e reconhecimento.
MÁRIO ALBANESE AO PIANO
9 – MARCELLO: E quais artistas já gravaram o Jequibau, você nos citaria alguns nomes…?
MÁRIO ALBANESE: Agnaldo Rayol, Altemar Dutra, Ciro Pereira, Cláudia, Continentino (jazz trio- pianista), Dulce Salles Cunha, Grupo Tom da Terra (Vocal Tasso Bangel), Hebe Camargo, Jair Rodrigues, Kadê o Tom, Leny Eversong, Luiz Loi Quinteto, Macumbinha & Sílvio Santisteban (“O Fino do Violão” LP Bandeirantes/Clock BR33025), Mário Albanese, Moacir Silva & The Jordans, Modern Tropical Quintet (Plinio Metropolous), Os Três Brasileiros (vocal dos irmãos Morais para os EUA), Os Três Morais, Pedrinho Mattar, Ruben Perez, Pocho, Six String Poetry com Silvio Santisteban (gravou com 16 anos!), The Wandermass Group, Uccio Gaeta, Zimbo Trio, Zero Hora, Sambossa 5, Walter Wanderley.
10 – MARCELLO: Você é um dos autores – ao lado de José Eduardo de Barros Ferreira – do Hino do Clube Atlético Paulistano, um dos clubes mais tradicionais da cidade de São Paulo, fundado em 1900, na última década do Século XIX .
Ele fez a letra e você a melodia. Diga-nos como surgiu e idéia e de quem partiu o convite para a elaboração da composição…!
MÁRIO ALBANESE: O convite foi do Presidente Luiz Ferraz do Amaral em 1980, sugerindo que Eduardo de Barros Ferreira tinha uma letra linda e evocativa dos feitos do Paulistano, e que daí poderia sair uma parceria para comemorar os oitenta anos do clube. Deu certo! A primeira audição foi com a orquestra de Osmar Milani na tradicional festa Branco e Vermelho.
O bloco “Unidos do Paulistano”, liderado pelo Joca – João Carlos Martins, com bandeiras do clube, se encarregou de gerar clima de festa e felicidade na sua animada participação. O fato foi registrado pela Folha de São Paulo de 21.12.1980, na coluna social assinada por Tavares de Miranda. Aos cinco (5) dias de dezembro de 2000 e para comemorar os 100 Anos do CAP, a Secretaria de Estado da Cultura promoveu  um concerto com a Orquestra Sinfônica Paulista, regida pelo Mº Antonio Carlos Neves, na Sala São Paulo, que interpretou, com arranjo do maestro regente, O Hino “Paulistano, Sempre!,  uma singela homenagem dos músicos aos idealizadores do Hino.
Posteriormente, em 2004, aos 14 dias de dezembro, no auditório do CAP, a Orquestra Sinfônica Paulista regida pelo Mº Adriano Machado, Coordenador Pedagógico do Núcleo de Cordas do Conservatório de Tatuí, interpretou o Hino Paulistano, Sempre!, em homenagem ao CAP e seus autores, Mário Albanese e Eduardo de Barros Ferreira.
A palavra hino, proveniente do grego hymnos ou do latim hymno, conceitua uma canção composta para expressar admiração ou exaltar o valor de uma entidade ou pessoa. Não tem forma definida e pode ou não ter letra. O hino de Espanha é intrumental. O dos EUA tem andamento lento. O Hino Nacional Brasileiro tem características próprias e é lindo, mas é longo para os interesses da TV.
Penso que as autoridades poderiam gerar uma versão oficial e resumida para essas ocasiões. O intermezzo, ou seja, a repetição da introdução e até a própria, poderiam ser suprimidas, caso pensem em algo nesse sentido. O que não se deve aceitar é que seja interrompido ao talante dos operadores da TV nos eventos esportivos.
Enfim, esse assunto merece avaliação que escapa ao momento.  Os autores do Hino Paulistano, Sempre!, cederam seus direitos pecuniários ao CAP, fato raríssimo, para não dizer inédito no meio artístico.
MÁRIO ALBANESE E CIA.
11 – MARCELLO: E a respeito daquela frase muito singela que você sempre utiliza nos seus textos, “o pensamento cria, o desejo atrai e a fé no trabalho realiza”…! Fale alguma coisa sobre ela.
MÁRIO ALBANESE: É uma frase indutora e reflexiva. Antes eu usava como auto-sugestão: Pensar para acertar, calar para resistir e agir para vencer! Depois eu a decodifiquei:  pensar = pensamento; calar = desejo; e agir = fé no trabalho ou seja, com ação!
Estimado Marcello, o propósito é sempre o mesmo: alimentar a esperança com vibrações positivas. Seu irmão de alma, Mário Jequibau Albanese.
12 – MARCELLO: E o encontro com o compositor e multiinstrumentista Garoto, como e em que ano você o conheceu, como foi a convivência e a parceria…! Cite o nome de algumas das composições que você fez com ele.
MÁRIO ALBANESE: Foi em 1949, ano em que completei meu curso de piano no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo ainda com dezessete anos. O convite partiu do José Raphael Musitano Pirágine, inseparável companheiro de conservatório, que insistiu que naquela noite iríamos conhecer um violonista de raros predicados.
Àquela época o meu interesse exclusivo era para o piano, o mais completo instrumento de cordas percutidas e tessitura de oitenta e oito (88) notas. A recusa veio pronta. Todavia, o companheirismo e a amizade pesaram na decisão e fomos para a Rua Pires da Mota, esquina com a Avenida Aclimação,para ouvir um violonista que em um instrumento de campo sonoro de três oitavas e uma quinta, 29 sons, mudou completamente o significado, não só do instrumento violão, com também do meu conceito sobre música.
Conheci um gênio! Aníbal Augusto Sardinha, artisticamente conhecido por GAROTO. A partir dai convivemos por sete anos até seu desenlace aos três dias de maio de 55, deixando imorredoura saudade. Quanto à parceria, foi somente uma: Amor Indiferença. No dia 22 da agosto de 1950 Garoto esteve na casa de meus pais, Rua Tupinambás, 164, no Paraíso, em São Paulo,quando incentivado por ele, coloquei letra na música fazendo a transcrição para piano em Mi bemol. Garoto adorou!
A letra não perdoou nem a escala dos tons inteiros, também conhecida como escala hexafônica. Essa visita teve registro porque Garoto escreveu na hora a linha melódica de uma música que se tornou um desafio para os violonistas, com a seguinte dedicatória: “Desvairada, valsa de Garoto para o Mário e Senhora sua mãe Dona Clara, ofereço sinceramente”.
Fato que você Marcello comprovou quando de sua honrosa visita. Essa música foi editada no álbum comemorativo dos 100 anos do Choro em 1977, Edições Fermata. No livro de Irati Antônio e Regina Pereira, “Garoto – Sinal dos Tempos”, editado pela FUNARTE em 1980. Essa composição aparece como sendo ainda inédita e com o nome de Jorge do Fuza… Como diria o filósofo: São coisas do futebol!!!
A composição “Meu Amigo Garoto”, que lhe foi dedicada em vida, relembra que em abril de 1955, subindo de táxi a Rua Machado de Assis, SP, perto das 23h00, encontro o Garoto, sozinho, na porta do prédio de nº 273, esperando pelo Ivo Araujo que ali morava. O sequestro aconteceu naturalmente… e fomos para o centro da cidade.. Na Av. Ipiranga encontramos com o Duilio Cosenza, violonista brasileiro em atividade nos EUA e que diante do Garoto teve uma reação que misturou felicidade, emoção e surpresa. Juntos fomos até o Maravilhoso, Taxi Dancing, para ouvir Meu Amigo Garoto interpretada pela orquestra de Osmar Milani em arranjo especial do maestro. Garoto foi recepcionado com entusiasmo e muitos aplausos.
Meu Amigo Garoto foi gravada por Sylvio Tancredi (LP Chantecler CMG 2028). Eu a gravei no LP Odeon (MOFB 3111) Mário Albanese – Insonia.
13 – MARCELLO: Outro grande amigo e parceiro do compositor Garoto, pra quem não sabe, foi o humorista e também compositor José Vasconcelos, lamentável e recentemente falecido…! Conte-nos algo a respeito e cite também algumas composições das quais ele participou como letrista…! Você esteve recentemente em casa dele, se não me falha a memória, no ano passado (2010), certo…?
MÁRIO ALBANESE: Estimadíssimo Marcello Laranja. Garoto e José Vasconcellos produzindo em parceria musical.
Nick Bar – Garoto e José Vasconcelos, salvo melhor juízo, é a mais conhecida e foi celebrizada na gravação de Dick Farney contando com a participação do próprio Garoto. Lágrimas de Sonho, Alô, Quem Fala, Baião do Lenhador, Caminhos da Saudade, Baião de Pé  Atrás, Desejo,  e Canção de Portugal.
Na peça  Precisa-se de um Presidente,  de autoria de José Vasconcellos  Geysa Bôscoli e Darcy Evangelista, estreada em São Paulo no Teatro Natal. A música foi assinada por Garoto, José Vasconcellos e Luís Cláudio, pseudônimo de Ceci de Abreu Pimenta (Ioaci de Abreu Pimenta) a 2ª esposa do Garoto. Um fato para se preservar!
Aos vinte dias de fevereiro de 1955, o Tênis Clube Paulista, por minha iniciativa, promoveu um baile pré-carnavalesco com o título São Paulo Quatrocentão, composição do Garoto em parceria com Chiquinho, música que se erigiu no Hino dos festejos comemorativos do Quarto Centenário de São Paulo.
Do show participou também o José de Vasconcellos que estava dando seus primeiros  passos em São Paulo. Os dois amigos e parceiros, alegres e felizes, pintaram e bordaram com música e humorismo diante de uma platéia entusiasmada.
O espetáculo somente terminou quando José de Vasconcellos, batendo bumbo saiu do palco para iniciar um cordão carnavalesco com os associados do clube.  Observe-se que  Eu Sou o Espetáculo, explodiria em 1961, quando José Vasconcellos, encarnou seu ídolo Denny Kaye  para transformar-se sozinho em uma companhia de comédia!
Duas horas de gargalhadas com humorismo sem palavrões nem grosserias. José Vasconcellos imitava figuras da política, da música e do rádio com absoluta perfeição. Poliglota, fez sucesso também no exterior. Para mitigar a saudade, eu e o  Lisindo Roberto Coppoli,  de carona no carro do José Raphael Musitano Pirágine, fizemos uma visita ao José de Vasconcellos e sua inseparável e querida esposa Irene, dia 24 de maio de 2008.
Encontramos o querido amigo José Vasconcellos,  enfraquecido pelo Alzheimer, mas felizmente ainda  lúcido e alegre. Esse precioso documento já foi inserido no livro Nosso Amigo Garoto, com fotos e legendas.
José Thomas da Cunha Vasconcellos Neto, faleceu no Hospital das Clínicas de SP, com 85 anos, terça-feira, 11 de outubro de 2011. Nascido em Rio Branco, estado do Acre, em 1926, deixará uma imorredoura saudades em todos nós.
JOSÉ VASCONCELLOS
14 – MARCELLO: Finalizando, pois, meu prezado Mário, como sempre, pedimos aos nossos entrevistados que deixem uma mensagem para o Clube do Choro de Santos…! Então peço a você que o faça da mesma forma…!
MÁRIO ALBANESE: A atividade do Clube do Choro me encanta! A inspiração de resgatar do esquecimento o Genio das Cordas, Aníbal Augusto Sardinha, Garoto, para tê-locomo patrono, foi consolidada por  lei que instituiu 28 de junho, seu aniversário,  como o Dia do Choro em São Paulo. Adormecido precocemente aos 39 anos, “O Gênio das Cordas, Nosso Amigo Garoto”, é um livro que aguarda publicação e que  enfoca a vida, a obra, bem como a amizade de seus autores no convívio de sete anos com o inigualável músico.
Valeu Mário, forte abraço e muito obrigado pela atenção…!…!
Marcello Laranja
 

Em 24 de setembro de 2003, às 14h38, recebi o e-mail de Heloisa Tapajós mailto: heloisatapajos@globo.com Assunto: Jequibau.
Verbete para o Dicionário Cravo Albin. Caríssimo Marcello Laranja. Creio que esse depoimento insere-se na entrevista que lhe devo. Um abraço! Mário Albanese.
Caro Mario, em primeiro lugar, gostaria de agradecer sua generosa colaboração ao Dicionário enviando esse arquivo que contém informações tão valiosas para complementação do seu verbete, no qual já estou trabalhando. Pensei também como seria importante o registro do verbete “Jequibau”. Perdoe a minha ousadia, mas aprendi a deixar de lado a timidez quando se trata do Dicionário.
Então vai aí um pedido: você não gostaria de escrever algumas linhas falando sobre o que vem a ser o jequibau? Estou preparando alguma coisa, mas gostaria de complementar o texto com uma definição do próprio autor do ritmo tipo: “Segundo Mário Albanese… etc.Eu ficaria super agradecida (e claro que o Ricardo Cravo Albin também)! Um grande abraço, com toda a minha admiração,
Heloisa. 

Resposta

Caríssima Heloísa Tapajós. Você é realmente uma memorialista instigante e sensível ao reconhecer a importância de um depoimento! Terei imenso prazer em atendê-la por que o assunto é apaixonante. Ressalve-se que a circunstância de expender minha opinião, depois de 38 anos do lançamento do jequibau, escapa e se distancia da primeira reação, aquela revelada sem a peneira da história. Natural, portanto, que algumas avaliações, em retrospecto, se mostrem equivocadas. É o caso do entendimento de que o jequibau é um samba de 5 tempos.

Entendo que essa concepção, longe de ser crítica, é elogiosa, pois reafirma e reforça o 5 por inteiro, um compasso quinário com desenho rítmico  (“Rythm Digest”) característico e próprio, fato que constitui-se no eixo central desta avaliação. Então, vamos lá: A dualidade se manifesta em tudo, na vida com o nascimento e a morte do homem e da mulher, baixo ou alto, branco ou negro, o sim e o não, dia e noite etc.
Percebe-se que o 1 e 2 do ritmo binário nos acompanha permanentemente. Na música acontece o mesmo, o inteiro se divide em duas metades e subdivide-se em 4, 8, 16, 32 e 64 notas, ou seja, a semibreve (esqueça o semi) representa o inteiro; a mínima, as duas metades; a semínima, a quarta parte etc. Nos compassos compostos, a figura pontuada vale três (3), e, mesmo assim, a ambivalência remanesce! Desenvolvida essa argumentação, afirmo que Jequibau não é samba nem subseqüente dele. A teoria tradicional da música conceitua o quinário com um compasso misto que alterna 3 + 2 = 5 ou 2 +3 = 5. É, portanto, um efeito de alternação de compassos que não constitui uma identidade real de cinco tempos. Para exemplificar ouça “Missão Impossível“, música do argentino Lalo Schifrin, ou ainda “TakeFive”, do saxofonista  Paul Desmond, integrante do Quarteto de Dave Brubeck. Ambas são conseqüência do esquema 3 + 2 = 5 e que, no meu modo de entender e apreciar, são geniais! No folclore argentino há uma dança chamada Los Amores, que alterna 2+ 3 = 5. Creio que o poeta de cordel Téo Macedo foi mais feliz ao dizer: Jequibau é  jequibau, diferente marcação, cinco tempos por inteiro, contrariando a tradição. Um compasso brasileiro, nova forma de expressão!  Jequibau é jequibau, a palavra é singular, não existe em dicionário, não adianta procurar e depois de tantos fatos, é hora de registrar! Mário “Jequibau” Albanese 

Cyro Marin Pereira (14.08.1930 – 09.06.2011)
por Mário Albanese
Músico é aquele que consegue transformar em som tudo que acontece ao seu redor. A música nasce por um impulso inato, sendo óbvio que necessita de conhecimento técnico para ter molde artístico. O ensino musical no Brasil foi sempre entendido como um complemento da educação e, portanto, um privilégio dos mais abastados.
Já, como fato social, sempre teve marcante importância, pois inexistem períodos sem música e, as expressivas manifestações musicais no carnaval, nos chorões e serenatas assim o comprovam.  Ainda, é de amplo conhecimento que a maioria, dos grandes nomes da música popular do passado, foi autodidata, instruiu-se por si, no convívio com outros músicos, ouvindo discos e também pela comunicação oral.
Houve época em que o músico era tratado como um pária, um indivíduo sem casta na sociedade, por ser boêmio e, sem profissão definida.  Cyro Marin Pereira, nascido, na cidade de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, veio para São Paulo em 1950 com 20 anos e foi um dos que aprimorou seu conhecimento musical no dia-a-dia  trabalhando como pianista, arranjador e regente de orquestra na  Rádio Record de São Paulo na rua Quintino Bocaiúva  onde me foi apresentado pelo inesquecível  Garoto, Aníbal Augusto Sardinha.
Àquela época e no campo da música popular, geralmente as músicas não eram escritas sendo apresentadas pelo autor tocando, cantando ou numa gravação em minicassete caseiro.  Assim e nessas condições, a importância do arranjador se evidenciava na estrutura final da composição ao agregar introdução, harmonia e ritmo,  fatores decisivos para sua aceitação. Em um artigo sobre o Cyro, publicado no jornal Hora de São Paulo, em 1982, destaquei a importância do arranjador e a necessidade de reconhecer como legítimo o direito conexo a que faz jus. Nesse sentido e com essa ótica o Ciro produzira um programa intitulado o Maestro Veste a Música, para explicar com detalhes a instrumentação utilizada e os efeitos produzidos. Lembro-me que Insônia, de minha autoria, com letra de Heitor Carillo, foi dissecada pelo Ciro nesse programa sem imaginar que no futuro seríamos parceiros.
Dessa proximidade resultou a gravação de SOL, minha composição inserida no LP Música dos Astros, PPL 12014, da Continental, com Cyro e Orquestra. O fato curioso foi o expediente utilizado pela gravadora de lançar esse mesmo disco mudando o título para Românticos Del Caribe, como contraponto ao sucesso obtido pelos Românticos de Cuba.
Sem dúvida, o convívio diário com o Cyro nos anos sessenta foi produtivo. Eu o reencontrei na Rádio e TV  Record instaladas na Av, Miruna, perto do aeroporto de Congonhas, num momento especial, pois os Maestros Gabriel Migliori, Hervé Cordovil e Ciro Pereira, estavam com folga no trabalho em razão das radicais  mudanças realizadas na grade de programação da emissora. Assim tivemos horas produtivas para conciliar as pesquisas que resultaram no jequibau, uma inovação autêntica que conseguiu, tal qual rastilho de pólvora, enorme repercussão nos EUA, consubstanciada nas gravações de renomados artistas e na inserção em métodos de ensino. Vencedor de concursos internacionais sua expansão mereceu registros em matérias publicadas por revistas e jornais especializados do mundo.
No livro, Cyro Pereira, Maestro, escrito por Irineu Franco Perpétuo, por feliz coincidência, a história do Jequibau se inicia na página 5/4 e vai até a de número 58. As pessoas queridas não morrem porque ficam encantadas na nossa lembrança, para sempre! O pensamento cria, o desejo atrai e a fé no trabalho realiza. Seu irmão de alma e eterno parceiro,  Mário Jequibau Albanese.



Your Comment