GRUPO “CHORO DAS TRÊS”
“O mais importante é quando o público gosta, e nós somos bem recebidas, como aqui em Santos, nós gostamos”
Em 15 de fevereiro de 2008, sexta-feira, no calçadão da Rua XV, em frente à sede do Clube do Choro de Santos, entrevistamos as meninas integrantes do Grupo “CHORO DAS TRÊS”. Anteriormente esse grupo era conhecido como “BALAIO DE GATO”. O nome do conjunto foi mudado e agora chama-se “CHORO DAS TRÊS” e é formado por ELISA (bandolim, banjo e clarinete), LIA (violão 7 cordas), CORINA (flauta), ADRIANO (cavaquinho) e EDÚ (pandeiro). Presentes os nossos companheiros diretores Ademir Soares, Luiz Antonio Pires, Obed Zelinschi, Florival Barletta, Luciana Gomes, Jorge Maciel e Marcello Laranja.
Marcello:
Eu vou começar a conversar com a Elisa que é a mais novinha. Elisa, quantos anos você tem, porque o choro e como é que o bandolim e depois o clarinete surgiram na sua vida?
ELISA
Bom, eu tenho quatorze anos – na segunda (18 de fevereiro de 2008) vou fazer quinze – e eu comecei a tocar bandolim porque as minhas irmãs já estavam tocando - eu estava tocando cavaquinho – tocava solo e meu professor perguntou...sugeriu para eu experimentar o bandolim que teria mais recurso para eu solar, seria uma coisa assim mais...que eu estava querendo. Então daí eu experimentei e gostei. Larguei o cavaquinho e fiquei com o bandolim. E o clarinete é um instrumento que, na minha opinião, é o mais bonito que tem, tem um som mais bonito e ele...você toca qualquer música nele que é sempre mais bonito. Então eu comecei a tocar clarinete faz...não sei...faz pouco tempo...fiz algumas aulas com o Stanley (do Grupo Nosso Choro) e eu adoro tocar. Eu não toco bem clarinete, mas eu não ligo (risos) se eu tocar vão ter que me ouvir.
Marcello:
E você também toca banjo, de vez em quando?
ELISA
Ah! De vez em quando eu toco banjo que eu também acho muito bonito o som, que a escala é parecida com o bandolim e tem músicas que no banjo ficam com uma cara super mais diferente, super-engraçado, mais divertido, mais alegre do que no bandolim.
Marcello:
Tá bem, essa foi a Elisa. Muito bem. Agora eu vou conversar com a Lia e a mesma pergunta que eu fiz à Elisa vou fazer à Lia. Quantos anos você tem, porque o choro e como é que o violão de 7 cordas apareceu na sua vida, como é que foi essa opção?
LIA
Eu tenho dezessete anos, eu comecei a tocar choro por causa da Corina. Ela começou a estudar flauta, ouvindo choro e nós começamos a ir pra São Paulo, freqüentar os shows e as rodas e eu comecei a estudar violão de 6 cordas. E nisso eu não conhecia violão de 7 cordas, passei a ver nas rodas, em shows. Aí eu comecei a ter aula com o Luizinho 7 cordas, mas eu só tinha 6 cordas. Daí ele e um outro professor que eu tive que é o Ed Galhardi, convenceram meus pais a comprar um 7 cordas pra mim. Daí eles me deram. De surpresa, eles me fizeram experimentar o violão. Não sabia que era meu. Daí , quando eu estava indo embora e fui devolver - “não, é seu”. Foi super-legal. Aí eu comecei a ter aula e estou até hoje.
Marcello:
E como é que foi essa aproximação com o choro, essa predileção pelo choro?
LIA
Então, foi por causa da Corina. A gente estava estudando música mas não tinha nenhum gênero, a gente não conhecia. Aí o meu pai comprou um CD do Altamiro Carrilho e a Corina se interessou. A gente achou bonito, ela já tocava flauta, mas eu ainda não tocava violão, tocava flauta doce. Daí a gente começou a ir na Rua do Choro em São Paulo pra ver músicos...choro de perto, ver como que era. E a gente viu que era uma coisa diferente do CD, que era mais vivo, era mais real. Aí a gente gostou e continuou tocando.
Marcello:
Legal. Essa foi a Lia. Muito bem, agora eu vou conversar com a Corina e a mesma pergunta eu vou repetir: Corina, como é que surgiu o choro da tua vida e porque...aliás, quantos anos você tem e porque você optou pela flauta? O que te levou à flauta?
CORINA
Pô eu to fazendo...eu fiz vinte anos já. Daqui a pouco eu não conto mais, daqui a pouco vira segredo. Eu comecei a tocar pequena. Eu comecei a estudar música com oito anos, porque na escola que eu fiz, na minha primeira série onde eu aprendi a ler, um professor voluntário ensaiou um coral, eu me interessei e comecei a tocar. E aí os meus pais sempre...meu pai principalmente, sempre ouviu muita música. Não necessariamente choro, mas assim, eu sempre tive disponível samba, jazz, bossa-nova, rock, todo tipo de música. E tinha um disco do Altamiro Carrilho, um disco clássico dele que é o “Choros Imortais”. Foi um disco que me encantou assim...um disco que até hoje quando eu ouço, fico emocionada. Eu passei a ouvir muito esse disco, eu só ouvia esse disco...
Marcello:
Inclusive ele é considerado até hoje um dos melhores discos de choro já gravados no Brasil.
CORINA
É excelente, um disco muito bom, ele faz coisas fantásticas na flauta, é tudo muito...
Marcello:
É, realmente ele é um gênio, sem dúvida...
CORINA
É. E aí eu comecei a ouvir demais aquele disco e eu tinha que mudar da flauta doce para um instrumento definitivo e aí escolhi a flauta, acabei ficando com a flauta. Aí um tempo depois eu comecei...queria tocar choro, mas não tinha orientação para isso. Eu morava em Porto Feliz (cidade do interior do Estado de São Paulo, na região de Sorocaba), estudava com um professor de flauta que não era flautista – ele tocava clarinete – e como que eu ia tocar choro em Porto Feliz? Entendeu! Aí eu comprei umas partituras, tocava lá o Carinhoso e mais uns dois choros, e aí a gente viu na TV que ia ter um show do Altamiro Carrilho em São Paulo, na Rua do Choro. Fomos para assistir, a gente adorou e tal e aí descobrimos que a Praça do Choro tinha toda a semana. A gente passou a freqüentar. Era engraçado. Os músicos passaram a reconhecer porque éramos três “catatauzinhos” assim...na Rua do Choro, podia estar chovendo que a gente estava lá.
Marcello:
A gente já se encontrou várias vezes, inclusive lá na Contemporânea, numa das rodas de choro mais tradicionais de São Paulo e vocês, novinhas, fazendo parte da roda de choro com a Velha-Guarda. Isso é que eu acho legal.
CORINA
É fantástico isso, porque a gente aprende muito com eles, e assim, uma grande parte desses “velhinhos” tratam a gente como se nós fôssemos netas deles, é uma gracinha. Muito gostoso, é muito bom mesmo.
Marcello:
Legal. Essa foi a Corina. Elisa, se você puder lembrar aqui pra gente, qual foi o melhor show que você...que vocês tiveram a melhor performance. Tem um espetáculo que vocês fizeram que ficou marcado na carreira de vocês, mesmo no tempo do Conjunto Balaio de Gato. Você poderia lembrar pra gente?
ELISA
Hum! Ai, não sei. Os shows que eu mais gosto “NÃO” são os shows que as pessoas ficam quietinhas assim...os shows que eu mais gosto são que nem o que teve ontem que...
Marcello:
Tem uma participação maior...
ELISA
É, que o público...você vê que o público...
Marcello:
Interage mais...
ELISA
É, que o povo vibra, que, as vezes, quando você faz um show num lugar que nem a gente fez no Réveillon da Paulista, que é um público muito grande, as vezes, o público não...
Marcello:
Às vezes nem presta a atenção...
ELISA
É, então, eu prefiro quando o público está lá...ele “NÃO” está assim, quietinho, mas ele está acompanhando cada coisa...cada movimento que você está fazendo...
Marcello:
Que você está fazendo, exatamente...
ELISA
E várias vezes aconteceu isso. Então eu não sei qual seria...
Marcello:
Então você gosta, literalmente, de agito?
ELISA
É. (risos). Um show como ontem, foi um show que eu adorei. (O Grupo Choro das Três apresentou-se na lanchonete do SESC no dia anterior à entrevista).
Marcello:
Legal, beleza. E você tem algum Corina, lembra de algum que você diria “esse marcou”!
CORINA
O Réveillon da Paulista marcou assim, porque quando a gente...a gente estava com muito medo. Quando a gente subiu no palco, a primeira música que nós tocamos foi a Ave Maria de Schubert e aquela multidão...estava um barulho...quando nós começamos a tocar, a Paulista inteira ficou em silêncio. Foi uma coisa que aí eu olhei para o meu pai, estava todo mundo chorando...
Marcello:
Emociona né?
CORINA
É. E também o show de ontem, o show que nós fizemos aqui da outra vez no Teatro Brás Cubas, que a gente tocou “Magali” do Arnaldinho...
Marcello:
Foi no aniversário do Clube do Choro...
CORINA
Isso.
Marcello:
E pra você Lia, tem algum que você lembra, ou você fica com a mesma opinião delas?
LIA
Fico com a mesma opinião. Eu acho que shows que a gente toca bem, sempre vai ter. Mas o mais importante é quando o público gosta, a gente é bem recebido, que nem aqui em Santos que a gente gosta, todo mundo que vai, a gente encontra com os músicos, eles vão tocar com a gente, que nem no Brás Cubas a gente interagiu, a gente tocou no show deles, eles no nosso show, então eu acho que isso é mais importante do que a gente ir lá e só tocar, eu acho que isso é mais legal.
Marcello:
E vocês sentiram alguma diferença na mudança do nome do grupo de Balaio de Gato, que já estava bem marcado, para Choro das Três? Vocês sentiram alguma diferença nisso?
LIA
As pessoas ainda nos reconhecem como Balaio de Gato, então a gente ainda está trabalhando bastante esse nome. A gente espera que o CD que saiu agora marque mais o nome novo. Mas continua sendo a gente, as mesmas pessoas que estão tocando, então, ninguém liga muito não.
Marcello:
Corina, o nome Balaio de Gato marcou né?
CORINA
É porque a gente teve...a gente fez bastante programas de TV, bastante coisa com aquele nome, e foi o primeiro nome. As pessoas conheceram a gente com aquele nome. E é um nome alegre...
Marcello:
Eu acho super bem bolado...
CORINA
É. Choro das Três é um...as pessoas assim, uma grande parte nem sabe o que é choro. Então você tem que ficar explicando choro, o que é, entendeu. É um nome mais restrito. Mas a gente espera que ele também dê certo.
Marcello:
Sem dúvida, vai dar certo. E aí Elisa, você está confiante? O CD vai vender bem?
ELISA
Ah! Espero que sim. E além de vender bem, espero que quem compre, goste. Pelo menos isso. Mas eu acho que vai vender muito bem.
Marcello:
E agora eu vou conversar com o Edu, que é o mentor intelectual, é o responsável por isso, porque ele é o pai das meninas e influenciou bastante com o seu bom gosto musical. E aí Edu, como é pra você acompanhar suas filhas, você acompanhar todo esse movimento desde que elas começaram até agora?
EDÚ
Bom, é uma imensa alegria e, como você viu ontem, é um sufoco também.
Marcello:
É barra pesada...
EDÚ
É barra pesada. Ontem eu tive que me superar. E, a princípio, eu sempre gostei de música - como elas já devem ter falado - e isso é uma coisa que eu aprendi com a minha mãe. Ela deu acesso pra gente em casa, para mim e para os meus irmãos, a muita informação musical. Aquelas coleções da Abril de música popular, de música clássica, a gente sempre teve isso e muitos outros discos. Meu pai quando viajava trazia discos do exterior e eu achei que isso ia ser importante para elas. Assim como eu toquei na época de escola, conheci um monte de gente. Era o que eu queria para elas. Para elas conhecerem alguém na escola. Corina começou a tocar, pô legal! elas vão aprender a tocar, vão poder brincar com a turminha da escola, participar de algum Festival. Jamais eu pensei que elas fossem...
Marcello:
Chegar a esse nível e a esse ponto...
EDÚ
De se profissionalizar e gostar de choro. Não foi esse o objetivo, mas tem sido muito gratificante.
Marcello:
Aconteceu de forma natural isso né?
EDÚ
Foi.
Marcello:
Você não disse: vocês vão montar um conjunto...!
EDÚ
Não, até porque eu não tocava choro. Meu negócio era bossa-nova, samba-canção, Noel, Cartola, esse tipo de coisa. Choro a Corina é que...é eu também descobri que é muito bacana, gostoso, muito mais...
Marcello:
Tem muita riqueza musical, harmônica, melódica, muito mais técnica...
EDÚ
É super agradável. Nós temos conhecido muita gente e tem aberto muitas portas, quer dizer, que outra profissão você pode ter, onde você vai ter acesso a tantas pessoas diferentes como a gente tem tido com a música? A gente tem viajado...você chegar, por exemplo, na Contemporânea e pega aqueles “mendigão” que estão lá andando e que vão te cumprimentar felizes da vida, como a gente tem conseguido tocar até para o Presidente da República. Então, é muito legal.
Marcello:
Obrigado Edu. Agora eu vou conversar com a Cris que é a mãe das meninas e empresária. E ela cuida...ela tem dois papéis absolutamente fundamentais nesse esquema do grupo: ela desempenha muito bem o papel de mãe e de empresária, cuida com muito zelo do visual das meninas, ela que trata dos assuntos de contrato, enfim, ela toma conta de tudo isso. E antes de começar a pergunta: Cris, eu quero fazer um agradecimento a você, ao Edu e às meninas, porque marcou a parceria do grupo, na época, Balaio de Gato e agora Choro das Três. É uma irmandade que existe com o Clube do Choro de Santos. Vocês vieram fazer o 3º. Aniversário e isso ficou muito marcado, inclusive com os acessos na Internet do “clip” que foi feito aqui em Santos, com o passeio do bonde e foi muito legal. Então a gente agradece essa parceria, que para nós é muito importante. Agora a pergunta que eu vou te fazer: como é pra você lidar com esse povo nos bastidores?
CRIS
Olha, elas são tranqüilas. Eu até achei que crescendo elas iam brigar mais, enfim, coisas de adolescente. Mas elas são tranqüilas. As meninas, mesmo com relação ao pai - como músico, não como pai, como elas dizem – elas têm um relacionamento muito tranqüilo. A gente viaja junto, dorme, levanta, trabalha, elas realmente são muito...eu não tenho, absolutamente, uma vírgula pra reclamar. Estão sempre de bom humor, estão sempre felizes...Então, eu, realmente...a única briga que a gente tem é nos camarins... (desabafo) “por favor organizadores, camarins para mulheres tem que ter muito espelho” (risos). Então, é a única coisa...”já está tempo demais no espelho”. Então, é a única coisa. Mas elas desenvolvem, cada uma dentro da sua área, inclusive o “clip” do Clube do Choro quem editou foi a Lia - que é o 7 cordas – todo o som, tudo que você ouve do grupo passa pela mão da Corina, então elas trabalham em conjunto, não tem uma divergência, uma briga. Tem um relacionamento normal eu estou muito contente. Acho que o choro foi uma escola de relacionamento e de amigos.
Marcello:
E qual é a tua expectativa para o CD, agora o primeiro oficial, porque vocês têm o anterior que é um “demo” com experiências de algumas gravações que elas fizeram. Mas agora o primeiro CD, Choro das Três, oficial, lançado pela Som Livre. Qual é a sua expectativa.
CRIS
Olha, a expectativa é que a mídia perceba que existe um Brasil desconhecido, tanto que o CD chama “Meu Brasil brasileiro. Que existe um Brasil que está absolutamente esquecido, que é um Brasil culto, sensível, curioso...
Marcello:
Principalmente sensível...
CRIS
São pessoas de uma sensibilidade, de uma curiosidade, e a gente tem percebido...ontem mesmo no show daqui de Santos, a quantidade de jovens...que música é essa, como é que vocês tocam, o que vocês estão fazendo?
Marcello:
Estão descobrindo, estão procurando conhecer...
CRIS
Então a nossa expectativa – com relação ao CD – é a oportunidade das pessoas conhecerem o choro, essa é a nossa grande expectativa.
Marcello:
E elas são um grande referencial justamente pela idade e pela técnica que elas já têm, muito novas e já tocando dessa maneira, nesse nível musical.
CRIS
Eu acho que é um grande incentivo pra quem ouve e acho que elas são disseminadoras da vontade de estudar, da vontade de se estudar um instrumento, de se organizar, de buscar realizar sonhos e esperanças que todos nós temos, não é? E que a juventude hoje tem...eu acho que tem perdido um pouco, tem sido muito imediatista e pra tocar choro não adianta ter pressa.
Marcello:
Não adianta ter pressa, exatamente.
CRIS
Então o cara vai ter que estudar, vai ter que se dedicar, vai ter que ouvir, vai ter que respeitar...
Marcello:
Vai ter que ler muito, vai ter que respeitar, exatamente.
CRIS
Então eu acho que o choro para a minha família foi uma benção e a minha grande expectativa, por incrível que pareça, é a oportunidade do Brasil conhecer uma música que muito pouca gente conhece. Eu acho que esse é o grande desafio, é levar essa música para a juventude que desconhece completamente o gênero, e acho que nós vamos conseguir atingir, pelo menos parcialmente aí...o CD está bem distribuído, a Som Livre está fazendo uma boa distribuição, então você tem sites, Saraiva, Cultura, mesmo da Som Livre...é que o CD saiu agora, nem show de lançamento foi, tanto que ontem foi comemoração. O show de lançamento nem foi organizado. Mas eu acho que é importante isso, que eles estão distribuindo antes do lançamento...então é...que é a mídia da juventude...que é Internet, você pode ouvir o CD pela Saraiva que é interessante e vamos pra briga, o CD já está em lojas do Rio Grande do Sul, do interior de São Paulo...Então quer dizer, aos pouquinhos, no nosso trabalho de formiga, a gente vai mostrando que existe um Brasil bacana, sério, responsável e, principalmente, profissional. Essa é a expectativa do CD.
Marcello:
Muito bem, aí foi a palavra da Cris, muito obrigado Cris, obrigado Edu, obrigado às meninas, integrantes do Grupo “Choro das Três” nesta entrevista, neste bate-papo super-gostoso para o Clube do Choro de Santos. Um abraço pra vocês e sucesso. Valeu.